A 10 de abril, aconteceu a terceira greve geral convocada pela Confederação do Trabalho da República Argentina (CGT) e pela Central dos Trabalhadores Argentinos (CTA) desde a tomada de posse de Milei. Esta greve insere-se no que a CGT designou por "jornada de ação" de 36 horas, iniciada na quarta-feira, dia 9, com uma mobilização massiva para o Congresso Nacional em apoio aos reformados e que prosseguiu com a greve geral de 24 horas.
Esta greve surge na sequência da escalada de mobilização social iniciada em fevereiro em resposta às políticas do governo de ultra-direita. As marchas de 1 de fevereiro e de 8 e 24 de março, especialmente após a brutal repressão de 12 de março contra os reformados, fizeram com que a pressão vinda de baixo obrigasse a direção da CGT a convocar esta nova greve.
Greve total e manifestações de massas, apesar da contenção da burocracia sindical
Esta greve demonstrou, mais uma vez, o enorme potencial que existe, a vontade da classe trabalhadora de lutar contra a extrema-direita. Houve uma participação massiva em todo o país e a atividade ficou praticamente paralisada nos bancos, na empresas públicas e nas grandes empresas. O principal campo de hidrocarbonetos de Vaca Muerta, a grande esperança de receitas petrolíferas da burguesia argentina, cessou a sua atividade. Os transportes aéreos funcionaram a 45% da sua capacidade, uma vez que os controladores de tráfego aéreo foram forçados pelos serviços mínimos impostos pelo governo. Mesmo assim, o pessoal de terra aderiu massivamente à greve e a Aerolineas Argentinas cancelou mais de 250 voos.
Além disso, as escolas e universidades públicas permaneceram fechadas durante a jornada, enquanto o sector da saúde manteve um número mínimo de funcionários para atender a emergências. Não houve atendimento ao público em repartições públicas, registos civis e repartições municipais em todo o país, nem entrega de correspondência pelo Correo Argentino.
Os sindicatos dos comboios, o sindicato do metropolitano de Buenos Aires e o sindicato dos taxistas aderiram à greve. O único sindicato que não aderiu foi o UTA, o sindicato dos condutores de autocarros. A direção deste sindicato, de importância capital para parar os transportes rodoviários e urbanos, tem uma política conciliatória com o governo de Milei e os patrões porque o fundo de previdência do sindicato está falido. O trabalho social vem do primeiro governo Perón (1945-1955) e dá aos sindicatos uma parte muito importante nos cuidados de saúde, afectando 46% da população. Os fundos disponibilizados pelo governo para garantir esta assistência têm sido historicamente um dos mecanismos utilizados pela burguesia argentina para controlar e pressionar a burocracia sindical.

Um dos factores centrais que leva a burocracia da CGT a fazer tudo o possível para conter a agitação e a vontade de lutar que existe entre as suas bases é o facto do governo de Milei ter garantido o dinheiro que recebem para o financiamento dos seus sistemas de saúde, que é a sua principal fonte de rendimento. Mas é de salientar que, apesar do boicote da burocracia da UTA, a greve foi retumbante e os autocarros que circularam estavam vazios, demonstrando a enorme força do movimento operário.
A ofensiva mediática e repressiva do governo fracassa
A reação do governo desde o início foi utilizar os meios de comunicação social e as redes sociais para tentar desacreditar a greve. Um sinal claro da sua preocupação e nervosismo quanto ao impacto da manifestação. Nos ecrãs dos terminais de comboios, vazios de passageiros, podia ler-se: "Ataque à República. A casta sindical está a atacar milhões de argentinos que querem trabalhar. Se te extorquem ou te obrigam a parar, denuncia-o ao 134".
A ministra da Segurança Nacional, Patricia Bullrich, publicou uma mensagem nas suas redes sociais afirmando que "as ruas já não pertencem àqueles que coagem, pertencem àqueles que trabalham". E acrescentou: “Marchas e greves de massas são coisas do passado. Hoje, os argentinos escolhem fazer um esforço e acompanhar um governo que está a fazer o que é necessário para fazer o país avançar.”
Um esforço inútil por parte do governo. A sua campanha brutal de propaganda, de ameaças e de intimidação através do recurso a forças repressivas foi confrontada com a massividade da greve e das marchas nas ruas.
Sob a sombra de um novo acordo com o FMI
Esta mobilização está a ocorrer à sombra de um novo acordo com o FMI que significaria um crédito de 20 mil milhões de dólares para garantir os pagamentos aos credores estrangeiros e ao capital especulativo argentino. Embora os termos ainda não sejam conhecidos, é certo que incluirá a receita habitual deste organismo financeiro controlado pelo imperialismo estado-unidense: mais cortes, privatizações e ataques à classe trabalhadora.
O acordo permitirá ao governo cumprir o prazo de pagamento da dívida pública deste ano, que não teria sido possível cumprir com as suas próprias receitas. No entanto, a guerra comercial com a China desencadeada pelos Estados Unidos vai prejudicar todos os países, e um dos mais afectados será a Argentina. Os EUA são o seu terceiro maior parceiro comercial, atrás do Brasil e da China. As tarifas de Trump vão atingir mais duramente os elos mais fracos do capitalismo ocidental, incluindo a economia argentina. As tensões financeiras criadas pelas tarifas já fizeram subir novamente a inflação em março. O seu declínio até agora este ano foi a ponta de lança da propaganda do governo, embora continue entre os mais altos do mundo. Por outro lado, o prémio de risco do país (que tinha sido reduzido em 2024) aumentou 5%, confirmando a Argentina como um dos países em que não é aconselhável investir.
O acordo com o FMI foi concluído após a vigésima viagem de Milei aos Estados Unidos desde o início do seu mandato. Mas esta salvação temporária, longe de estabilizar as finanças públicas, aumenta a dívida do Estado e prepara uma crise económica e política ainda mais profunda nos próximos meses. Uma grande parte do capital estrangeiro já percebeu isso e há anos que se retira do país, liquidando as suas operações e vendendo-as a conglomerados argentinos. A última foi a espanhola Telefónica, que na semana passada anunciou a venda da sua filial argentina ao grupo local Telecom. Alguns dias antes, a alemã Mercedes-Benz fez o mesmo. Seguem os passos das empresas estado-unidenses Exxon Mobile e Procter & Gamble e dos bancos HSBC (Reino Unido) e Itaú (Brasil).

Abaixo Milei! Continuar a luta com uma greve geral de 48 horas e um programa que exproprie a oligarquia!
O sucesso da greve de 10 de abril mostra a força da classe trabalhadora argentina e que é possível reverter os cortes e pôr fim a este governo de extrema-direita e à sua criminosa motosserra. Este êxito deve ser um estímulo para continuar a luta. Não há tempo a perder para voltar a atacar, para utilizar todo o potencial que existe e continuar a aumentar a organização do movimento e a confiança na sua própria força. Os últimos meses têm servido para trazer novos sectores das massas impiedosamente atacados pelo governo com o apoio da burguesia. Os reformados, os movimentos queer e feminista, os trabalhadores do sector público... Esta greve elevou o tom geral da luta de classes no país, aumentando o nível de confronto feroz entre as classes.
É muito provável que a burocracia da CGT tente adiar a mobilização e ganhar tempo desviando a luta das ruas para o terreno eleitoral e parlamentar, usando as eleições para o Congresso marcadas para outubro para argumentar que o caminho a seguir agora não é através de novas greves, mas sim minando o apoio parlamentar que Milei tem dos partidos de direita e conseguindo um grupo parlamentar peronista maior. Mas abrandar a luta só pode contribuir para dar oxigénio ao governo quando este está contra a parede.
Nós marxistas não desprezamos o terreno eleitoral. Milhões de jovens e trabalhadores aproveitarão as eleições para expressar sua indignação e atacar este governo de extrema direita. Mas por trás da motosserra de Milei está a crise do capitalismo mundial e argentino. Também a decisão da classe dominante de tentar quebrar o movimento operário e os oprimidos como um todo, fazendo retroceder os seus direitos durante décadas.
A única coisa que pode derrubar Milei e derrotar esses planos é manter e intensificar a mobilização nas ruas. Será muito difícil para a burocracia sindical conter a pressão social, especialmente quando chegarem as condições impostas pelo FMI para o novo empréstimo. Um novo ataque de Milei poderia desencadear uma revolta social como o "Argentinazo".
Tanto a burguesia quanto o peronismo querem desarmar essa perspetiva, mas o movimento de massas está mais uma vez apontando nessa direção. A tarefa da esquerda militante na Argentina é impulsionar nessa direção, agitando a continuação da luta com uma nova greve geral de 48 horas que envolva mais sectores das massas. Junto com os trabalhadores sindicalizados, também 50% da população que vive da economia informal.

Ao mesmo tempo, há-que ser apresentada uma saída revolucionária. Um programa que defenda de forma clara e decidida o fim do capitalismo na Argentina. Para isso, as alavancas básicas da economia (os bancos e as grandes empresas) devem ser nacionalizadas sob o controlo da classe trabalhadora. E, juntamente com isso, promover desde já a auto-organização das massas em assembléias e comités de ação em cada bairro e em cada centro de trabalho ou estudo, para lutar contra a miséria e a escassez, dando-lhes uma coordenação local, regional e nacional.
Esta é a única forma de continuar a impulsionar a mobilização, de impedir que seja travada ou descarrilada e de derrubar o fascista Milei e o seu governo de extrema-direita. Mas também para dar uma perspetiva mais ampla às massas: a da luta por uma Argentina socialista, que é a única saída do poço sem fundo da crise capitalista, organizando a partir da base um novo Estado operário contra este Estado burguês podre, corrupto até ao âmago, organizado para servir a oligarquia sob uma fachada de falsa democracia.