Publicamos a primeira parte deste artigo escrito por Leon Trotsky a 9 de novembro de 1934 em que faz uma análise das condições económicas e sociais que levam à ascenção do bonapartismo e fascismo, assim como das posições que os partidos revolucionários e a classe trabalhadora devem adotar para os combater.

Em 1934 a esquerda francesa, socialista e comunista, está desconcertada perante a profundidade da crise social aberta pela crise capitalista de 1929, que resultou na ascenção do fascismo ao poder na Alemanha.

O Partido Socialista, cujo pomposo nome oficial era Seção Francesa da Internacional Operária (SFIO), dividiu-se internamente entre uma ala direita, os neosocialistas, que iniciaram uma deriva que os levou ao fascismo e à colaboração com Hitler, e uma ala esquerda, representada principalmente pelos jovens socialistas, que virou rapidamente para posições marxistas e revolucionárias.

O Partido Comunista Francês, que na sua fundação tinha agrupado a maioria da classe trabalhadora organizada, estava a definhar e a perder militância como consequência dos bruscos zigzags que Estaline impunha aos partidos da Internacional Comunista. A teoria ultraesquerdista do “terceiro período”, que repudiou a política leninista da frente única e considerava os partidos socialistas como uma variante do fascismo (“socialfascistas”, na linguagem da época), tinha isolado o PCF e, tal como tinha acontecido com o Partido Comunista Alemão, anulá-va-o como ator revolucionário.

Nesta situação, as organizações fascistas francesas, a quem o triunfo de Hitler havia infundido uma notável ousadia, tentaram tirar partido do caos reinante. No dia 6 de fevereiro de 1934 assaltaram o parlamento e, embora nem por um momento tenham conseguido tomar nas suas mãos as rédeas do poder estatal, provocaram uma mudança de governo e aprofundaram a instabilidade do regime.

A situação atual tem muitas semelhanças com a dos anos trinta do século passado. A grave crise do sistema capitalista sente-se de forma particularmente aguda em Portugal, com a adopção de políticas mais autoritárias pelos governos burgueses, o empobrecimento de vastas camadas da população, a crise das instituições burguesas e dos partidos tradicionais e a ascenção do fascismo.

As lições a retirar desta obra são muito valiosas para compreender e atuar face aos resultados das últimas eleições legislativas, aos prováveis resultados da próxima eleição presidencial e em particular aos violentos ataques levados a cabo nos últimos dias por grupos fascistas em Lisboa e Porto. Incentivamos todas as leitoras e leitores a colocar em prática essas lições juntando-se à Esquerda Revolucionária.


Nestas páginas, queremos explicar aos trabalhadores avançados o destino da França nos próximos anos. Para nós, a França não é a Bolsa, nem os bancos, nem os trustes, nem o governo, nem o Estado-Maior, nem a Igreja - todos estes são opressores da França -, mas a classe trabalhadora e os camponeses explorados.

O Desmoronamento da Democracia Burguesa

Após a guerra ocorreram uma série de revoluções que obtiveram brilhantes vitórias: na Rússia, na Alemanha, na Áustria-Hungria e, mais tarde, em Espanha. Mas foi somente na Rússia que o proletariado tomou plenamente o poder nas suas mãos, expropriou os seus exploradores e soube como criar e manter um Estado operário. Em todos os outros casos, o proletariado, apesar da vitória, deteve-se a meio caminho devido aos erros da sua direção. Como resultado, o poder escapou-lhes das mãos e, deslocando-se da esquerda para a direita, acabou por ser presa do fascismo. Noutros países, o poder caiu nas mãos de ditaduras militares. Em nenhum deles se mostrou o Parlamento capaz de conciliar as contradições de classe e de assegurar a marcha pacífica dos acontecimentos. O conflito resolveu-se com armas nas mãos.

O povo francês acreditou durante muito tempo que o Fascismo nada tinha a ver consigo. Que tinham uma república na qual todas as questões são resolvidas pelo povo soberano através do sufrágio universal. Mas a 6 de fevereiro alguns milhares de fascistas e monárquicos, armados de revólveres, paus e navalhas, impuseram ao país o governo reacionário de Doumergue, sob a proteção do qual os bandos fascistas continuam a crescer e a armar-se. O que nos prepara o amanhã?1

Em França, como em outros países da Europa (Inglaterra, Bélgica, Holanda, Suíça, países escandinavos), ainda existe um parlamento, eleições, liberdades democráticas ou o que resta delas. Mas, em todos esses países, a luta de classes exacerba-se no mesmo sentido em que antes se desenvolveu na Itália e na Alemanha. Quem se consola com a frase "a França não é a Alemanha" não tem noção do que diz. Atualmente, em todos os países vigoram as mesmas leis: as da decadência capitalista. Se os meios de produção continuam nas mãos de um pequeno número de capitalistas, não há salvação para a sociedade. Está condenada a seguir de crise em crise, de miséria em miséria, de mal a pior. Nos vários países as consequências da decrepitude e decadência do capitalismo expressam-se sob diversas formas e com ritmos desiguais. Mas as características básicas do processo são as mesmas em todo o lado. A burguesia está a levar a sociedade à completa bancarrota. Não é capaz de assegurar ao povo nem o pão nem a paz. É precisamente por isso que não pode suportar a ordem democrática por muito mais tempo. E compelida a esmagar os trabalhadores através do uso de violência física. Mas é impossível acabar com o descontentamento de trabalhadores e camponeses apenas com a polícia. Para mais, é frequentemente impossível fazer o exército marchar contra o povo. Este começa a decompor-se e termina com a passagem de grande parte dos soldados para o lado do povo. Por isso, o grande capital é obrigado a criar bandos armados particulares, especialmente treinados para atacar os trabalhadores, como certas raças de cães são treinadas para atacar a caça. A função histórica do Fascismo é esmagar a classe operária, destruir as suas organizações e sufocar a liberdade política quando os capitalistas se sentem incapazes de dirigir e dominar com a ajuda da maquinaria democrática.

O fascismo encontra o seu material humano sobretudo no seio da pequena-burguesia. Esta vê-se totalmente arruinada pelo grande capital. Não existe saída para si na presente ordem social, mas não conhece outra. O seu descontentamento, revolta e desespero são desviados pelos fascistas do grande capital e dirigidos contra os trabalhadores. Pode-se dizer que o Fascismo é o colocar a pequena-burguesia ao serviço dos seus piores inimigos. Deste modo o grande capital arruína inicialmente as classes médias e, em seguida, com a ajuda dos seus demagogos fascistas, incita a pequena-burguesia desesperada contra o os trabalhadores. O regime burguês só pode ser preservado através de métodos assassinos como estes. Até quando? Até que seja derrubado pela revolução proletária.

O Começo do Bonapartismo em França

Em França, o movimento da democracia para o fascismo ainda está na sua primeira etapa. O parlamento existe, mas já não tem os poderes de outros tempos, e nunca mais os recuperará. A maioria dos deputados, mortos de medo depois de 6 de fevereiro, chamaram Doumergue ao poder, o salvador, o árbitro. O seu governo coloca-se acima do parlamento. Não se apoia sobre a maioria "democraticamente" eleita, mas direta e imediatamente sobre o aparato burocrático, sobre a polícia e o exército2. Precisamente por isso, Doumergue não pode admitir nenhuma liberdade para os funcionários públicos e, em geral, para os empregados do Estado3. Necessita de um aparato burocrático dócil e disciplinado, em cuja cúpula se possa manter sem perigo de cair. A maioria do parlamento, aterrada pelos fascistas e pela "frente comum", é forçada a curvar-se perante Doumergue. 

Atualmente escreve-se muito sobre a próxima "reforma" da Constituição, sobre o direito de dissolução da Câmara dos Deputados, etc. Todas estas questões não têm senão um interesse jurídico. No plano político, a questão já está resolvida. A reforma realizou-se sem viagem a Versalhes4. O surgimento dos bandos fascistas armados na arena deu aos agentes do grande capital a possibilidade de se elevar acima do parlamento. Nisto consiste hoje a essência da Constituição francesa. Tudo o resto é apenas ilusão, fraseologia ou engano consciente.

O papel atual de Doumergue (como o dos seus possiveis sucessores, do tipo de Tardieu) não constitui um novo fenómeno. É um papel similar ao que cumpriram, noutras condições, Napoleão I e Napoleão III. A essência do bonapartismo consiste nisto: apoiando-se na luta de dois campos, "salva" a "nação" com a ajuda de uma ditadura burocrático-militar. Napoleão I representa o bonapartismo da impetuosa juventude da sociedade burguesa. O bonapartismo de Napoleão III é o do momento em que, na cabeça da burguesia, começa a aparecer a calvície. Na pessoa de Doumergue encontramos o bonapartismo senil do declínio capitalista. O governo de Doumergue representa o primeiro grau na passagem do parlamentarismo ao bonapartismo. Para manter o seu equilíbrio, Doumergue necessita do apoio dos fascistas e outros bandos que o levaram ao poder. Pedir-lhe que dissolva - não no papel, mas na realidade - os Jeunesses Patriotes, os Croix de Feu, os Camelots du Roi5, etc., é pedir-lhe que corte o ramo sobre o qual se apoia. 

Naturalmente, oscilações temporárias num e noutro sentido são possíveis. Assim, uma ofensiva prematura do fascismo poderia provocar certa viragem "à esquerda" nas altas esferas governamentais. Doumergue daria temporariamente lugar não a Tardieu, mas a Herriot. Mas, em primeiro lugar, em nenhum momento se disse que os fascistas fariam uma tentativa prematura de golpe de Estado. Em segundo lugar, uma viragem temporária à esquerda nas altas esferas não mudaria a direção geral do desenvolvimento, e só adiaria o desfecho. 

Já não há caminho de regresso à democracia pacífica. Os acontecimentos conduzem inevitável e irresistivelmente a um conflito entre o proletariado e o fascismo.

O Bonapartismo Vai Durar Muito?

Quanto tempo pode manter-se o atual regime bonapartista de transição? Ou, dito de outra forma: quando tempo resta ao proletariado para se preparar para o combate decisivo? Naturalmente, é impossível responder a esta pergunta com exatidão. Mas podem ser estabelecidos certos factores com o fim de se avaliar a velocidade com que todo o processo se está a desenvolver. O elemento mais importante é a questão do destino imediato do Partido Radical.

A própria aparência do atual regime bonapartista liga-o, como dissemos, ao início de uma guerra civil entre os campos políticos extremos. Encontra o seu principal apoio material na polícia e no exército. Mas também tem um apoio à esquerda: o Partido Radical-Socialista. A base de deste partido de massas é constituída pela pequena-burguesia urbana e rural. A direção do partido é formada por agentes "democráticos" da grande burguesia que, de tempos a tempos, deram ao povo pequenas reformas e, mais frequentemente, frases democráticas, que o salvaram (em palavras) da reação e do clericalismo, mas que em todas as questões importantes fizeram a política do grande capital. 

Sob a ameaça do fascismo e, ainda mais, sob a do proletariado, os Radical-Socialistas viram-se obrigados a passar do campo da "democracia" parlamentar para o do bonapartismo. Como o camelo sob o chicote do seu condutor, o radicalismo levou os joelhos ao chão para permitir à reação capitalista sentar-se entre as suas bossas. Sem o apoio político dos Radicais, o governo Doumergue seria impossível neste momento.

Se se compara a evolução política da França com a da Alemanha, o governo Doumergue e os seus possíveis sucessores correspondem aos governos Brüning, Papen, Schleicher, que preencheram o intervalo entre a República de Weimar e Hitler. No entanto, há uma diferença que, politicamente, pode ter enorme importância. O bonapartismo alemão entrou em cena quando os partidos democráticos colapsavam, enquanto os nazis cresciam com uma força prodigiosa. Os três governos "bonapartistas" da Alemanha, contando com uma bases de apoio muito débil, equilibravam-se sobre uma corda estendida sobre o abismo entre dois campos hostis: o proletariado e o fascismo. Esses três governos caíram rapidamente. O campo do proletariado estava então dividido, não preparado para a luta, desorientado e traído pelos seus dirigentes. Os nazis puderam tomar o poder quase sem luta.

O fascismo francês, entretanto, ainda não representa, hoje, uma força de massas. Em contrapartida, o bonapartismo tem um apoio, nem muito seguro nem muito estável, porém de massas, na figura dos Radicais. Entre estes dois fatos existe uma ligação interna. Pelo caráter social da sua base, o Radicalismo é o partido da pequena-burguesia. Ora, o fascismo não se pode converter numa força de massas senão conquistando a pequena-burguesia. Noutras palavras: em França, o fascismo pode desenvolver-se acima de tudo à custa dos Radicais. Este processo já está em curso, embora ainda esteja nas suas fases iniciais.

O Papel do Partido Radical

As últimas eleições locais deram os resultados que se podiam e deviam prever. Os flancos, isto é, os reacionários por um lado e o bloco dos trabalhadores por outro ganharam posições, e o centro, ou seja, os Radicais, perderam. Mas os ganhos e perdas ainda são negligenciáveis. Caso se tratassem de eleições parlamentares, estes fenómenos teriam sem dúvido tomado proporções muito mais consideráveis. Para nós, os deslocamentos verificados não têm importância em si mesmos, a não ser como sintoma de mudanças na consciência das massas. Mostram que o centro pequeno-burguês já se começou a desmoronar em favor dos campos dos extremos. Isto significa que os restos do regime parlamentar vão ser progressivamente roídos; os extremos vão crescer; o choque entre eles aproxima-se. Não é difícil compreender que esse processo é absolutamente inevitável.

O Partido radical é o partido com cuja ajuda a grande burguesia mantinha as esperanças da pequena-burguesia na melhora progressiva e pacífica de sua situação. Este papel dos radicais só foi possível enquanto a situação económica da pequena-burguesia se mantinha suportável e tolerável, enquanto a sua ruína massiva se adiava e maninha esperanças no futuro. É verdade que o programa dos Radicais nunca saiu do papel. Não realizaram nenhuma reforma social séria em favor dos trabalhadores, nem poderiam tê-lo feito: tal não lhes seria permitido pela grande burguesia, em cujas mãos estão todas as reais alavancas do poder, os bancos e a Bolsa, a imprensa, os funcionários de alto escalão, diplomatas chave e o Estado-Maior. 

De tempos a tempos os Radicais obtinham pequenas esmolas em benefício da sua clientela, sobretudo à escala local, com cuja ajuda mantinham as ilusões das massas populares. Assim foi até a última crise. Atualmente, mesmo para o camponês mais atrasado, fica claro que não se trata de uma crise passageira ordinária, como as houve, não poucas, antes da guerra, mas de uma crise de todo o sistema social. São necessárias medidas firmes e decisivas. Quais? O camponês não sabe. Ninguém lhe disse o que lhe haviam de ter dito.

O capitalismo levou os meios de produção a um nível tal que se encontram paralisados pela miséria das massas populares, arruinadas por esse mesmo capitalismo. Por isso mesmo, todo o sistema entrou num período de decadência, de decomposição, de putrefação. O capitalismo não só não pode dar aos trabalhadores novas reformas sociais, nem sequer as pequenas esmolas: vê-se obrigado a tirar as que deu antes. Toda a Europa entrou numa época de "contra-reformas" económicas e políticas. O que provoca a política de despojo e asfixia das massas não são os caprichos da reação, mas a decomposição do sistema capitalista. Aí está o facto fundamental, que deve ser assimilado por cada trabalhador se não quiser ser enganado por frases vazias.

É precisamente por isso que os partidos reformistas democráticos se decompõem e perdem força, um após outro, em toda a Europa. A mesma sorte espera os Radicais franceses. Apenas tolos podem pensar que a capitulação de Daladier ou a traição de Herriot face à pior reação são o resultado de causas fortuitas ou temporárias ou de falta de caráter desses dois líderes lamentáveis. Não! Os grandes fenómenos políticos têm sempre profundas causas sociais. A decadência dos partidos democráticos é um fenómeno universal cujas causas assentam na decadência do próprio capitalismo. A grande burguesia diz aos Radicais: "Agora não é tempo para brincadeiras. Se não pararem de cortejar com os socialistas e de prometer relutantemente ao povo mundos e fundos, chamo os fascistas. Compreendam bem que 6 de fevereiro foi apenas uma primeira advertência!" Depois disso, o camelo Radical põe-se de joelhos. Não lhe resta outra coisa a fazer.

Porém o Radicalismo não encontrará a sua salvação por esse caminho. Ligando o seu destino, aos olhos do povo, àquele da reação, inevitavelmente apressa o seu próprio fim! A perda de votos e mandatos nas eleições locais é apenas o começo. O processo de colapso do Partido Radical desenrolar-se-á cada vez mais rápido. A questão principal é saber em favor de quem se dará essa queda inevitável e irresistível: se da revolução proletária ou do fascismo.

Quem apresentará primeiro, mais amplamente e com maior força, o programa mais convincente às classes médias? E, o mais importante, quem conquistará a sua confiança, mostrando com palavras e factos que é capaz de eliminar todos os obstáculos no caminho de um futuro melhor: o socialismo revolucionário ou a reação fascista? Desta questão depende a sorte da França por muitos anos. Não só a da França, senão a da Europa. Não só a da Europa, senão a do mundo inteiro.

As "Classes Médias", O Partido Radical e o Fascismo

Desde o momento da vitória dos nazis na Alemanha fala-se muito nos partidos e grupos de "esquerda" da necessidade de aproximação às "classes médias" para se barrar a estrada ao fascismo. A fação Renaudel e companhia separou-se do Partido Socialista com o objetivo específico de aproximar-se dos Radicais6. Mas, ao mesmo tempo que Renaudel, que vive preso às ideias de 1848, estendia as duas mãos para Herriot, este tinha-as ocupadas: uma com Tardieu e a outra com Louis Martin7.

Apesar disso, não se conclui aqui, em absoluto, que a classe trabalhadora possa virar as costas à pequena-burguesia, abandonando-a à sua sorte. De modo algum! Aproximar-se dos camponeses e dos pequenos-burgueses da cidade, atraí-los para o nosso lado, é a condição necessária de êxito na luta contra o fascismo, para não falar da conquista do poder. Apenas é necessário colocar o problema de um modo correto. Mas para isso deve-se compreender claramente qual é a natureza das "classes médias". Em política, nada é mais perigoso, especialmente num período crítico, que repetir fórmulas gerais sem examinar o seu conteúdo social.

A sociedade contemporânea é composta por três classes: a grande burguesia, o proletariado e as classes médias, ou pequena-burguesia. As relações entre estas três classes determinam, em última instância, a situação política. As classes fundamentais são a grande burguesia e o proletariado. Apenas estas duas classes podem ter uma política independente, clara e consequente. A pequena-burguesia caracteriza-se pela sua dependência económica e heterogeneidade social. A sua camada superior está conectada diretamente com a grande burguesia. A camada inferior mescla-se com o proletariado, e chega mesmo a cair no estado de lumpemproletariado. Devido à sua situação económica, a pequena-burguesia não pode ter uma política independente. Oscila sempre entre os capitalistas e os trabalhadores. A sua própria camada superior empurra-a para a direita; as suas camadas inferiores, oprimidas e exploradas, são capazes, em certas condições, de virar bruscamente à esquerda. Estas relações contraditórias entre as diferentes camadas das “classes médias” sempre determinaram a política confusa e inconsistente dos Radicais e as suas vacilações entre o Cartel8 com os socialistas, para acalmar a sua base, e o bloco nacional com a reação capitalista, para salvar a burguesia. A decomposição definitiva do Radicalismo começa quando a grande burguesia, ela mesma num impasse, não lhe permite continuar a vacilar9.

A pequena-burguesia, as massas arruinadas das cidades e do campo, começa a perder a paciência. Adota uma atitude cada vez mais hostil para com sua própria camada superior. Convence-se da falência e da perfídia da sua direção política. O camponês pobre, o artesão e o pequeno comerciante convencem-se de que um abismo os separa de todos esses Presidentes de Câmara, esses advogados, esses carreiristas políticos do género de Herriot, Daladier, Chautemps e companhia que, pelo seu modo de vida e pelas suas concepções, são grandes burgueses. É precisamente essa desilusão da pequena-burguesia, a sua impaciência, o seu desespero, que o fascismo explora. Os seus agitadores estigmatizam e maldizem a democracia parlamentar, que protege carreiristas e "staviskratas"10 mas nada concede aos trabalhadores. Estes demagogos brandem o punho em direção aos banqueiros, grandes comerciantes, capitalistas. Essas palavras e gestos correspondem plenamente aos sentimentos dos pequenos proprietários, que se sentem presos num beco sem saída. Os fascistas mostram audácia, saem à rua, enfrentam a polícia, tentam varrer o Parlamento pela força. Isto impressiona o pequeno-burguês afundado no desespero. Ele diz para si mesmo: "Os Radicais, entre os quais há muitos patifes, venderam-se definitivamente aos banqueiros; os socialistas prometem há muito eliminar a exploração, mas nunca passam das palavras aos fatos; os comunistas não é possível entendê-los: hoje é uma coisa, amanhã outra; vejamos se os fascistas nos podem salvar."

A Passagem das “Classes Médias” Para o Fascismo é Inevitável?

Renaudel, Frossard e os seus semelhantes imaginam que a pequena-burguesia está apegada sobretudo à democracia, e que precisamente por isso necessitam unir-se aos Radicais. Que monstruosa aberração! A democracia não é mais que uma forma política. A pequena-burguesia não se preocupa com a casca, mas sim com o miolo. A democracia mostra-se impotente? Ao diabo com a democracia! Assim raciocina e sente cada pequeno-burguês. 

Na crescente revolta das camadas inferiores da pequena-burguesia contra as suas próprias camadas superiores, "instruídas", nos municípios, distritos e parlamento, encontra-se a principal fonte social e política do fascismo. A isso deve-se acrescentar o ódio da juventude intelectual, esmagada pela crise, pelos advogados, professores, deputados e ministros fortuitos. Também aqui os intelectuais pequeno-burgueses inferiores se rebelam contra os que estão por cima deles. 

Significa isto que a passagem da pequena-burguesia para o fascismo é inevitável? Não, tal conclusão seria um vergonhoso fatalismo. O que é realmente inevitável é o fim do Radicalismo e de todos os agrupamentos políticos que liguem a sua sorte à deste último. 

Em condições da decadência capitalista, não há mais lugar para um partido de reformas democráticas e de progresso "pacífico". Qualquer que seja o caminho que os eventos tomem na França, o Radicalismo desaparecerá da cena, rejeitado e desonrado pela pequena-burguesia que definitivamente traiu. 

Todo o trabalhador consciente convencer-se-á pela experiência de cada dia que passa de que a nossa previsão corresponde à realidade. Novas eleições trarão derrotas para os Radicais. Secções inteiras sairão uma atrás da outra, as massas populares abaixo e os grupos de carreiristas assustados acima. Deserções, cisões, traições seguir-se-ão ininterruptamente11. Nenhuma manobra ou bloco salvarão o Partido Radical. Arrastará consigo para o abismo o "partido" de Renaudel, Déat e companhia. O fim do Partido Radical é o resultado inevitável do fato de que a sociedade burguesa não pode mais resolver as suas dificuldades com métodos supostamente democráticos. A cisão entre a base da pequena-burguesia e a sua direção é inevitável.

Mas isso não significa de modo algum que as massas que seguem o Radicalismo devem infalivelmente colocar as suas esperanças no fascismo. Certamente o sector mais desmoralizado, mais desqualificado e mais ávido da juventude das classes médias já fez a sua escolha nesse sentido. É sobretudo nesta fonte que se abastecem os bandos fascistas. Mas as grandes massas pequeno-burguesas das cidades e do campo ainda não fizeram a sua escolha. Hesitam ante uma grande decisão. É precisamente porque hesitam que ainda continuam, mas já sem confiança, a votar nos Radicais. Esta situação de hesitação, de irresolução, não durará, no entanto, anos, mas apenas meses. Os desenvolvimentos políticos vão adquirir um ritmo febril no próximo período. A pequena-burguesia só rejeitará a demagogia do fascismo se colocar a sua fé num outro caminho. Esse outro caminho é o da revolução proletária.

É Verdade que a Pequena-Burguesia Teme a Revolução?

Os cretinos parlamentares, que acreditam conhecer o povo, gostam de repetir: "Não se deve assustar as classes médias com a revolução; elas não gostam de extremos." Generalizada desta forma, a afirmação é absolutamente falsa. Naturalmente, o pequeno proprietário prefere a ordem enquanto os seus negócios vão bem e tenha a esperança de ficarem ainda melhor. 

Mas quando perde esta esperança, passa a ser presa fácil da raiva e a ficar pronto para se entregar às medidas mais extremas. Em caso contrário, como teria podido derrotar o Estado democrático e conduzido o fascismo ao poder na Itália e na Alemanha? Os pequeno-burgueses desesperados vêem no fascismo, antes de tudo, uma força combativa contra o grande capital, e acreditam que, ao contrário dos partidos da classe trabalhadora, que trabalham apenas com a língua, o fascismo utilizará os punhos para impor mais "justiça". Entendem, à sua maneira, que não poderão prescindir do uso da força. 

É falso, triplamente falso, afirmar que atualmente a pequena burguesia não se volta para os partidos da classe trabalhadora porque teme "medidas extremas". Muito pelo contrário. A camada inferior da pequena-burguesia, as suas grandes massas, só vê nos partidos da classe trabalhadora máquinas parlamentares. Não acredita na sua força, nem na sua capacidade de luta, nem na sua disposição, desta vez, para levar a luta até ao fim. 

Se assim é, vale a pena substituir o Radicalismo pelos seus colegas parlamentares à esquerda? É desta foram que raciocina ou reage o proprietário semi-expropriado, arruinado e revoltado. Sem a compreensão desta psicologia dos camponeses, artesãos, empregados, pequenos funcionários - psicologia que surge da crise social -, é impossível elaborar uma política correta.

A pequena-burguesia é economicamente dependente e está politicamente atomizada. Por isso não pode ter uma política própria. Necessita de um "líder" que lhe inspire confiança. Esta liderança individual ou coletiva (indivíduo ou partido) pode ser fornecida por uma ou outra das duas classes fundamentais: ou pela grande burguesia ou pelo proletariado. O fascismo unifica e arma as massas dispersas. A partir de uma "poeira humana" organiza destacamentos de combate. Assim, dá à pequena-burguesia a ilusão de ser uma força independente. Ela começa a imaginar que, realmente, comandará o Estado. Não é surpreendente que essas ilusões e esperanças lhe subam à cabeça!

Mas a pequena-burguesia pode também encontrar o seu líder no proletariado. Assim o demonstrou na Rússia e, parcialmente, na Espanha. Tendeu a isso na Itália, na Alemanha e na Áustria. Infelizmente, os partidos do proletariado não estiveram à altura da sua tarefa histórica.

Para atrair a pequena-burguesia para o seu lado o proletariado deve conquistar a sua confiança. E, para isso, deve começar por ter confiança nas suas próprias forças. Necessita de ter um programa de ação claro e estar disposto a lutar pelo poder por todos os meios possíveis. Fortalecido pelo seu partido revolucionário para uma luta decisiva e implacável, o proletariado diz aos camponeses e aos pequenos burgueses da cidade: "Lutamos pelo poder. Eis aqui o nosso programa. Estamos prontos a discutir com vocês mudanças neste programa. Não usaremos a força a não ser contra o grande capital e os seus lacaios; mas com vocês, explorados, quero fazer uma aliança sobre a base de um programa concreto." O camponês compreenderá esta linguagem. Falta-lhe somente ter confiança na capacidade do proletariado para tomar o poder. Para isso, é indispensável eliminar da Frente Única todo o equívoco, toda a indecisão, todas as frases vazias. É indispensável compreender a situação e colocar-se seriamente no caminho revolucionário.

Uma Aliança com os Radicais Seria uma Aliança Contra as Classes Médias

Renaudel, Frossard e os seus semelhantes pensam seriamente que uma aliança com os Radicais é uma aliança com as "classes médias" e, consequentemente, uma barreira contra o fascismo. Estas pessoas não vêem outra coisa que as sombras parlamentares. Ignoram a evolução real das massas e correm atrás do Partido Radical, que já tem os dias contados e que  até lá lhes vira as costas. Pensam que numa época de grande crise social, uma aliança de classes pode ser substituída por um bloco com uma clique parlamentar comprometida e condenada à extinção. Uma verdadeira aliança do proletariado e das classes médias não é uma questão de estatística parlamentar, mas de dinâmica revolucionária. Essa aliança é preciso criá-la e forjá-la na luta.

O âmago da situação política atual está no fato de que a pequena-burguesia desesperada começa a desembaraçar-se do jugo da disciplina parlamentar e da tutela da corja "radical"-conservadora, que sempre enganou o povo e agora o traiu definitivamente. Nesta situação, ligar-se aos Radicais significa autocondenar-se ao desprezo das massas e empurrar a pequena-burguesia para os braços do fascismo, que verá como único salvador.

O partido da classe trabalhadora não deve ocupar-se com uma tentativa inútil de salvar um partido em falência. Pelo contrário, deve acelerar com todas as suas forças o processo de liberação das massas da influência Radical. Quanto mais zelo e audácia puser no cumprimento dessa tarefa mais rapidamente preparará a verdadeira aliança da classe trabalhadora com a pequena-burguesia. É necessário posicionar-se à cabeça das massas e não no seu encalço. Pior para aquele que se deixe ficar para trás!

Quando Frossard nega ao Partido Socialista o direito de desmascarar, enfraquecer e decompor o Partido Radical, atua não como um socialista mas como um radical conservador. Só tem direito à existência histórica o partido que acredita no seu programa e se esforça para reunir todo o povo sob sua bandeira. Caso contrário não é um partido histórico, mas uma clique parlamentar, um grupo de carreiristas. Não é apenas um direito, mas um dever elementar do partido do proletariado libertar as massas trabalhadoras da nefasta influência da burguesia. Esta tarefa histórica adquire, na atualidade, uma importância particular, pois os Radicais esforçam-se mais do que nunca para ocultar o trabalho da reação, adormecer e enganar o povo, e assim preparar a vitória do fascismo. E os Radicais de esquerda? Também eles capitulam fatalmente ante Herriot, assim como Herriot o faz ante Tardieu.

Frossard tem esperança de que a aliança dos socialistas com os Radicais conduzirá a um governo de "esquerda", que dissolverá as organizações fascistas e salvará a República. É difícil imaginar uma amálgama mais monstruosa de ilusões democráticas e cinismo policial. Quando dizemos que o que é necessário é uma milícia popular, Frossard e seus semelhantes objetam: "Contra o fascismo não se deve lutar com meios físicos, mas ideologicamente." Quando dizemos: apenas uma audaciosa mobilização revolucionária das massas, que só é possível na luta contra o Radicalismo, é capaz de minar o terreno sob os pés do fascismo, os mesmos respondem: "Não, apenas a polícia do governo Daladier-Frossard pode salvar-nos."

Que argumentos patéticos! Os Radicais tiveram o poder e, se consentiram em cedê-lo a Doumergue, não foi por que lhes faltou a ajuda de Frossard, mas porque temiam o fascismo, temiam a grande burguesia que os ameaçava com navalhas monárquicas, e porque temiam mais ainda o proletariado, que começava a levantar-se contra o fascismo. Para cúmulo, foi o próprio Frossard quem, assustado com o espanto dos Radicais, aconselhou Daladier a capitular! 

Se se admite por um instante - hipótese claramente inverossímil - que os Radicais consentiram em romper a aliança com Doumergue por uma aliança com Frossard, os bandos fascistas, desta vez com a colaboração direta da polícia, teriam saído às ruas em número três vezes maior, e os Radicais, junto com Frossard, ter-se-iam imediatamente rastejado para debaixo da mesa ou escondido nos redutos mais secretos dos seus ministérios.

Mas imaginemos uma outra hipótese ainda mais fantástica: a polícia de Daladier-Frossard "desarma" os fascistas. Isso resolve a questão? Quem desarmará essa mesma polícia que, com a mão direita, devolverá aos fascistas o que lhes havia tomado com a esquerda? A comédia do desarmamento pela polícia não faria mais que aumentar a autoridade dos fascistas enquanto combatentes contra o Estado capitalista. Os golpes contra os bandos fascistas só podem ser eficazes na medida em que esses bandos sejam simultaneamente isolados politicamente. 

Entretanto, o hipotético governo Daladier-Frossard nada daria aos trabalhadores ou às massas pequeno-burguesas, pois não poderia atentar contra os fundamentos da propriedade privada. E, sem expropriação dos bancos, das grandes empresas comerciais, das indústrias-chave, dos transportes, sem o monopólio do comércio exterior e sem uma série de outras medidas profundas, é absolutamente impossível socorrer o camponês, o artesão ou o pequeno comerciante. Pela sua passividade, impotência, mentiras, o governo Daladier-Frossard provocaria uma tempestade de revolta na pequena-burguesia e empurrá-la-ia definitivamente para a via do fascismo... se esse governo fosse possível.

É preciso reconhecer, no entanto, que Frossard não está só. No mesmo dia (24 de outubro) em que o moderado Zyromski intervinha no Le Populaire contra a tentativa de Frossard de recriar o Cartel8, Cachin intervinha no L'Humanité12 para defender a ideia de um bloco com os Radicais-Socialistas13. Cachin saudava com entusiasmo o fato dos Radicais se terem pronunciado pelo "desarmamento dos fascistas”. 

É verdade que os Radicais se pronunciaram pelo desarmamento de todos, inclusive das organizações dos trabalhadores. Naturalmente, nas mãos do Estado bonapartista, tal medida seria dirigida sobretudo contra os trabalhadores. Naturalmente, os fascistas "desarmados" receberiam no dia seguinte o dobro de armas, não sem a ajuda da polícia. Mas para quê preocupar-se com reflexões sombrias? Todo o homem necessita de esperança. E eis aqui Cachin, que segue as pegadas de Wels e Otto Bauer, os quais, no seu momento, esperaram a salvação por meio de um desarmamento realizado pela polícia de Brüning e Dollfuss.14 

Fazendo uma viragem de 180 graus, Cachin identifica os Radicais com as classes médias. Só vê os camponeses oprimidos através do prisma do Radicalismo. Não imagina a aliança com os pequenos proprietários trabalhadores senão sob a forma de bloco com os parlamentares carreirista que, por fim, começaram a perder a confiança dos pequenos proprietários. Em vez de alimentar e de atiçar a incipiente revolta do camponês e do artesão contra os exploradores "democráticos" e de a dirigir para uma aliança com o proletariado, Cachin prepara-se para apoiar os Radicais falidos com a autoridade da "frente comum" e, desse modo, empurrar a revolta das camadas mais exploradas da pequena-burguesia para o caminho do fascismo15.

A negligência teórica paga-se sempre de forma cruel na política revolucionária. O "antifascismo", como o "fascismo", não são para os estalinistas concepções concretas, mas antes grandes bolsas vazias que enchem com tudo o que lhes cai nas mãos. Para eles, Doumergue é um fascista, como Daladier também o foi antes. De fato, Doumergue é um explorador capitalista da ala fascista da pequena-burguesia Radical. Atualmente estes dois sistemas combinam-se no regime bonapartista. Doumergue também é, à sua maneira, um "antifascista", pois prefere uma ditadura "pacífica", militar e policial do grande capital a uma guerra civil de resultado sempre incerto. Por terror ao fascismo, e mais ainda ao proletariado, o "antifascista" Daladier aliou-se a Doumergue. Mas o regime de Doumergue é inconcebível sem a existência de bandos fascistas. A análise marxista elementar demonstra assim a completa inconsistência da ideia da aliança com os Radicais contra o fascismo! Os próprios Radicais fazem questão de mostrar pela sua ação quão fantásticas e reacionárias são as quimeras políticas de Frossard e Cachin.


Notas

1. A insurreição fascista de 6 de fevereiro de 1934 provocou a demissão do governo de Daladier e a formação de um gabinete dito de "união nacional", presidido por Gaston Doumergue e no qual figuravam, entre outros, o marechal Pétain, André Tardieu, encarregado de estudar a "reforma da Constituição", Pierre Laval, Edouard Herriot e o líder "neo-socialista" Adrien Marquet. Daladier tinha-se demitido sem estar em minoria. Os Radicais, com a exceção de 27 deputados que se abstiveram, apoiaram o governo de união nacional no qual participava seu líder Herriot.

2. A presença de Pétain no governo significava evidentemente a adesão dos chefes do Exército à solução de "unidade nacional".

3. No seu discurso pela rádio de 24 de março, Doumergue foi particularmente ameaçador em relação aos funcionários públicos, que seria aliás o alvo principal dos decretos-lei de abril, prevendo despedimentos de 10% dos quadros.

4. De acordo com a Constituição vigente em França durante a República (1871-1940), as reformas constitucionais deviam ser aprovadas numa sessão conjunta do Senado e da Câmara dos Deputados, reunidos em Versalhes.

5. Grupos nacionalistas, monárquicos e fascistas. Os Jeunesses Patriotes (Juventudes Patrióticas), inspirados pelos Camisas Negras de Mussolini, eram financiados pelo capital industrial e recrutavam essencialmente entre os estudantes universitários. O Croix de Feu (Cruz de Fogo) era composto por veteranos da Primeira Guerra Mundial. Os Camelots du Roi eram a juventude da Action Française.<

6. A tendência dita "neo-socialista" da SFIO, dirigida pelo veterano Renaudel, tinha defendido a necessidade de "rejuvenescer" a teoria e os métodos do socialismo. Derrotada em julho de 1933 num Congresso realizado em Paris, rompeu depois da expulsão de vários de seus dirigentes para constituir em dezembro de 1933 o Partido Socialista da França. A partir de fevereiro de 1934, a maioria dos "neos" se juntou não só aos Radicais, de quem queriam ser aliados permanentes, mas também a Tardieu, Pétain e Laval. A partir de 1934, Frossard iria retomar na SFIO as teses defendidas antes pelos "neos". A direção da SFIO, que tinha condenado a aliança com os Radicais quando a proposta era feita pelos "neos", apoiou-a enquanto Frente Popular quando foi feita pelo Partido Comunista Francês.

7. Louis Martin foi, entre as duas guerras, o representante no parlamento da "direita tradicional".

8. Cartel: acordo parlamentar entre Radicais e Socialistas.

9. Edouard Herriot tinha sido sucessivamente presidente do Conselho do governo do Cartel, depois ministro de Estado no governo de Poincaré, de Unidade Nacional.

10. No período a que se refere o texto, vários escândalos financeiros abalaram a França, fornecendo material propagandístico aos fascistas. O termo staviskratas refere-se ao protagonista do maior destes escândalos: Stavisky, vigarista ligado às altas esferas governamentais.

11. A primeira divisão ocorreu imediatamente após o congresso de Clermont Ferrand: o líder da minoria, Gabriel Cudenet, demitiu-se, com grande repercussão. Nos anos seguintes, o Partido Radical dividiu-se em dois entre os adversários da abertura à esquerda, com Emile Roche, e os seus defensores, os "Jovens Radicais" de Pierre Cot e Jean Zay. Estes últimos, no entanto, depois de se haverem abstido no Parlamento, iriam aprovar no Congresso a participação dos Radicais no governo Doumergue.

12. L’Humanité (A Humanidade): Jornal fundado em 1904 por Jean Jaurès como órgão do Partido Socialista Francês (PSF), que se viria a tornar a Secção Francesa da Internacional Operária (SFIO) um ano mais tarde. Durante a Primeira Guerra Mundial esteve nas mãos da ala direita e manteve uma posição social-chauvinista. Desde dezembro de 1920, após o congresso da SFIO realizado em Tours aprovar a sua constituição como Partido Comunista Francês, tornou-se o órgão central do PCF.

13. No dia 9 de outubro de 1934, durante uma reunião de coordenação dos partidos Socialista e Comunista, o dirigente do PC Maurice Thorez propôs "ampliar" a unidade com vista a constituir "a aliança das classes médias com a classe operária".

14. Os dirigentes dos partidos Social-Democratas da Alemanha (Wels) e da Áustria (Otto Bauer) tinham chamado os trabalhadores a "exigir" aos governos Brüning e Dollfuss o desarmamento dos grupos nazis. Mais tarde, depois da oferta do deputado Ybarnégary, da Croix de Feu (Cruz de Fogo), de dissolver os grupos armados de sua organização, Blum, e depois Thorez, propuseram igualmente dissolver os "grupos de proteção" dos seus partidos.

15. A viragem provocada pela proposta de Thorez no comité de coordenação de 9 de outubro foi seguida pela reunião de Bullier, no dia 10, onde ele defendeu um "vasto agrupamento popular". A partir de 22 de outubro, Cachin, no L'Humanité, retoma sistematicamente nos seus títulos a expressão "Frente Popular", a qual Maurice Thorez, a 24 de outubro, em Nantes, esclarece que deve englobar "os grupos de Radicais hostis à reação". A Frente Popular será finalmente constituída com os Radicais e na base de seu programa.

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