No passado dia 29 de Junho, o governo de direita da Nova Democracia (ND) apresentou um projecto de lei no qual se endurece a repressão e as restrições para organizar e participar em manifestações e protestos.

Um ano depois da direita ter ganho as eleições legislativas e poucos meses depois do fim do confinamento, os protestos sociais na Grécia começam a ressurgir e a burguesia grega tem uma certeza: para enfrentar a crise capitalista e manter os seus lucros, vai continuar a tentar esmagar os direitos sociais e a piorar as condições laborais. O governo da ND, ao seu serviço, não hesita em recuperar medidas legislativas próprias da época da ditadura.

O projecto de lei mencionado estabelece sanções de até um ano de prisão por participar em protestos não autorizados, além de que responsabiliza os organizadores dos danos à propriedade pública e à propriedade privada que possam ocorrer nas manifestações.

Contra esta lei, os sindicatos e os movimentos sociais convocaram, de 7 a 9 de Julho, manifestações contra a designada “lei da ditadura” em 40 cidades. Em Atenas participaram cerca de 10.000 pessoas.

Os protestos foram duramente reprimidos pela polícia, que utilizou gás lacrimogéneo e levou a cabo inúmeras cargas policiais e uma multitude de detenções. A luta contra esta lei repressiva mantém-se, impulsionada pela juventude e por novas camadas após a amarga experiência com o governo do Syriza.

A catástrofe económica e social na Grécia continua

Depois de todos os ataques e cortes sociais dos últimos anos, apoiados pelos capitalistas gregos e desenhados pelo FMI, pelo BCE e pela UE, que tanto sofrimento causaram à maioria da população, as perspectivas económicas para a Grécia são de novo muito sombrias.

Antes do confinamento, decretado a 12 de Março, esperava-se um crescimento do PIB de 2,4% para 2020. Mas com a chegada da pandemia, as previsões estimam uma queda de 10%, e o desemprego, que actualmente é de 16%, prevê-se que crescerá até 20%.

Se tivermos em conta o grave estado da economia grega a seguir à crise de 2008 e o que representaram as medidas draconianas da troika para a classe trabalhadora durante estes últimos dez anos, a situação encaminha-se para uma nova catástrofe social.

A recessão mundial e a crise sanitária afectam duplamente a frágil economia grega: o turismo representa 12% do PIB, sector no qual se prevêem perdas de entre 8 mil e 10 mil milhões de euros.

Da mesma forma que os restantes governos ao serviço do capital, os subsídios de dinheiro público para garantir os lucros das empresas durante o tempo de paralisação da economia, constituíram a parte de leão dos recursos disponibilizados pelo Executivo heleno para atenuar os efeitos da pandemia, atingindo 6.800 milhões de euros.

A dívida pública, em Maio, era 176% do PIB e a projecção da Comissão Europeia é que acabe se acabe 2020 com 196,4%.

O rigoroso confinamento conteve a propagação do vírus, e com 11 milhões de habitantes, o Covid-19 provocou 194 mortos. Esta medida permitiu ao empobrecido sistema público de saúde contornar, de momento, o colapso total.

Durante os primeiros cinco anos de crise, o orçamento para a saúde foi reduzido 8,7% a cada ano, e o sistema já se encontrava à beira do desastre antes da pandemia. É ilustrativo o facto da Grécia contar com apenas metade das camas de unidades de cuidados intensivos em relação à média europeia.

A pandemia obrigou o governo a atrasar os novos planos de privatização e a disponibilizar temporariamente 70 milhões de euros ao sistema público de saúde — migalhas para tratar de cobrir as necessidades mais urgentes.

Um ano de blindagem dos lucros capitalistas, de ataques aos trabalhadores e de aumento da repressão

O ND ganhou as eleições em Julho de 2019, destronando o Syriza, resultado do descontentamento provocado pelas políticas de cortes sociais e de submissão à troika aplicada pelo governo de Alexis Tsipras entre a classe trabalhadora e a juventude.

A participação naquelas eleições foi a segunda mais baixa na história da Grécia: 57,92%.

O actual governo é composto pela direita e ultraliberais. O primeiro-ministro Kyriakos Mitsokakis faz parte da elite e está vinculado a grandes bancos e agências financeiras.

As primeiras medidas aplicadas pelo Executivo foram a descida de impostos para empresas, a diminuição das contribuições empresariais à segurança social e a redução da despesa social, aprofundando as receitas catastróficas de austeridade.

A burguesia grega exige cortes mais profundos e para poder levá-los a cabo considera imprescindível impôr medidas repressivas e antidemocráticas que asfixiem o movimento operário.

O pacote de medidas antidemocráticas não acabou. Uma das primeiras iniciativas foi o endurecimento do Código Penal e a última é o projecto de lei que estabelece um controlo mais apertado das manifestações.

O Ministério da Protecção do Cidadão, dirigido por Michalis Chrisochoidis, expulso do PASOK por aceitar o cargo, criou um novo corpo policial fortemente armado, intitulado de “Panteras Negras”. Este encontra-se destacado nas esquadras mais movimentadas. Também reactivou a unidade especial Drassi (anteriormente Delta), conhecidos como os “hooligans da polícia” e que foi desmantelada pelo Syriza.

Os corpos policiais foram o principal mecanismo de repressão depois da guerra civil e durante a ditadura dos coronéis. O aparelho de Estado que permaneceu intacto e sem ser purgado após a chegada da “democracia”, reforça, uma vez mais, esta ferramenta repressiva contra a luta social.

Desde finais de 2019 que aumentaram as denúncias por actos violentos e arbitrários da polícia, que passaram a ser bastante comuns. Estas práticas atendem à estratégia do governo de incutir o medo assegurando impunidade à brutalidade policial.

Num dos bairros centrais de Atenas, Exarchia, onde existe uma grande participação social, estão destacados, de maneira quase permanente forças de choque que intimidam arbitrariamente os moradores. Nos últimos meses realizaram-se despejos de espaços ocupados há anos por refugiados e migrantes. Também são muitos os casos de jovens humilhados pela polícia, obrigados a despir-se em parques de estacionamento públicos ou restaurantes.

No mês de Novembro realizaram-se protestos estudantis para exigir a ilibação de dois estudantes e contra a supressão da lei de asilo universitário. Esta lei foi introduzida a seguir à queda da ditadura com o objectivo de evitar os eventos de 1973, quando grupos de militares entraram com um tanque na Universidade Politécnica de Atenas contra a ocupação de estudantes em protesto contra a ditadura, provocando cerca de 40 mortos.

Depois desta supressão, a polícia entrou pela primeira vez, desde 1974, numa universidade e reprimiu uma manifestação estudantil.

A juventude e o movimento operário voltam ao caminho da luta

Continuando esta estratégia repressiva, o governo apresentou em Setembro de 2019 um projecto de lei que marcou um salto qualitativo na dificuldade em convocar greves. De acordo com este projecto, estas têm que ser aprovadas mediante votação electrónica.

Com isto, procura-se acabar com a convocação de assembleias gerais, impedir que as bases participem directa e colectivamente nas lutas, localizar melhor as e os trabalhadores mais combativos e fortalecer o controlo policial e burocrático do movimento.

Além disso, esta lei afecta igualmente os contratos coletivos de trabalho, dando prioridade aos acordos de empresas em detrimento dos sectoriais ou estatais, atacando o coração da força dos sindicatos como ferramenta da classe trabalhadora no seu conjunto.

O movimento operário respondeu imediatamente a estas medidas e convocou uma greve geral a 24 de Setembro e a 2 de Outubro de 2019. As duas greves gerais contaram com uma forte participação de médicos, professores, trabalhadores de transportes marítimos e armadores dos principais portos do país e significaram o primeiro passo no rearmamento da classe trabalhadora e de todos os movimentos sociais contra a direita.

A estratégia repressiva do governo tem alimentado de novo a mobilização e a tomada de consciência de novas camadas de jovens e trabalhadores. Muitos dos movimentos sociais foram paralisados pelo desilusão com o Syriza, que após cinco anos de governo esgotou a confiança e o ânimo de centenas de milhares de activistas.

As mobilizações destes últimos meses começam a ser protagonizadas por várias camadas de jovens que não experienciaram o duro fiasco do Syriza. O governo de direita tenta travá-las através da criminalização dos estudantes, tentando gerar medo com a repressão arbitrária.

A classe trabalhadora grega está a recuperar o seu espírito combativo e para esta nova etapa conta com a valiosa experiência dos últimos anos e com a inspiração de enormes movimentos de massas que atravessam os cinco continentes.

A tarefa fundamental, uma vez mais, encontra-se na necessidade de construir um verdadeiro partido revolucionário que, dotado do programa da revolução socialista, acabe de uma vez por todas com a barbárie social imposta pela burguesia e pelo podre sistema capitalista.

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