Passaram quinze dias desde a abominável farsa de 13 de outubro, quando Donald Trump apresentou no Egito o “plano de paz” para Gaza, acordado com Netanyahu. Desde então estes dois genocidas deixaram bem claro que a única paz que estão dispostos a aceitar é a paz dos cemitérios.

Gaza submetida a um sangrento regime colonial

Israel continua a ocupar 58% do território de Gaza, incluindo todas as saídas para países vizinhos. A Gaza do “acordo de paz” é a maior prisão a céu aberto do planeta. Um autêntico campo de concentração cercado por tropas sionistas.

E apenas doze dias depois de apresentarem esse acordo infame, meios de comunicação independentes e organizações humanitárias informavam que já se tinham registado entre 47 e 80 violações do cessar-fogo por parte do exército sionista, resultando em mais de uma centena de palestinianos assassinados, incluindo famílias inteiras.

Este prelúdio sangrento revela o verdadeiro carácter do “plano de paz”.

Enquanto preparam a sua administração colonial disfarçada de “governo tecnocrático com personalidades árabes”, Washington e Telavive continuam a levar a cabo uma limpeza étnica sistemática, e os políticos sionistas vangloriam-se publicamente das torturas infligidas aos mais de 10.000 prisioneiros palestinianos que mantêm sequestrados em prisões e campos de concentração.

Desde a Esquerda Revolucionária reiteramos, mais uma vez, o nosso apoio ao direito do povo palestiniano à autodefesa armada perante esta situação de brutal ocupação colonial, limpeza étnica e genocídio. Solidarizamo-nos com todos os combatentes que enfrentam esta luta e denunciamos as situações de isolamento, maus-tratos, tortura e privação dos direitos humanos elementares sofridos pelos presos e presas.

Como temos denunciado insistentemente, a única coisa que mudou com esta farsa anunciada no Egito é que agora os genocidas contam com o aval da ONU e de todos os governos capitalistas, a começar pelos 20 presidentes e chefes de Estado que se deslocaram a Sharm el-Sheikh para prestar vassalagem a Trump e compactuar com as suas medidas colonialistas e imperialistas.

Um genocídio que continua

Embora a intensidade e a extensão dos bombardeamentos não sejam as das semanas anteriores, o plano para expulsar centenas de milhares de palestinianos para campos de refugiados nos países árabes vizinhos e submeter o resto a condições de semiescravidão continua por diferentes vias.

A maioria da população de Gaza é obrigada a sobreviver em enclaves constituídos por tendas precárias, sem água nem eletricidade, sem hospitais, sem escolas, sem os meios básicos necessários para viver, e sob a vigilância do exército sionista, que continua a ter impunidade absoluta para intervir e atacá-los a qualquer momento.

As condições em Gaza não podiam ser mais terríveis. “O tecido urbano foi quase totalmente destruído pelos projéteis, bombas, drones e escavadoras israelitas: 80% dos edifícios estão danificados ou arrasados, 90% das habitações destruídas e 80% das terras agrícolas devastadas. A faixa abriga agora 17.000 órfãos e a ONU estima que os últimos dois anos atrasaram o desenvolvimento humano em Gaza em 69 anos, colocando-o nos níveis de 1955, como consta no relatório do PNUD Gaza War: Expected Socioeconomic Impacts on the State of Palestine (outubro de 2024)”.

Toda esta destruição reforça outro elemento central do holocausto nazi-sionista: a fome provocada conscientemente. Como advertiu o diretor-geral da Organização Mundial da Saúde (OMS), Tedros Adhanom Ghebreyesus, no programa Today da BBC Radio 4: “A situação sanitária na Faixa de Gaza é ‘catastrófica’ e as suas consequências prolongar-se-ão ‘durante gerações’.” Embora Israel tenha permitido a entrada de alguns fornecimentos médicos e alguma ajuda humanitária, o volume continua muito aquém do necessário para “reconstruir um sistema de saúde colapsado”. O mesmo ocorre com as necessidades alimentares.

A maioria da população de Gaza é obrigada a sobreviver em enclaves constituídos por tendas precárias, sem água nem eletricidade, sem hospitais, sem escolas, sem os meios básicos necessários para viver, e sob a vigilância do exército sionista. “Mesmo com a trégua, a fome, os ferimentos massivos, as epidemias e a falta de acesso a água potável e saneamento criam uma combinação mortal (…) Segundo dados das Nações Unidas, desde a trégua entraram em Gaza mais de 6.700 toneladas de alimentos, um número muito inferior ao objetivo diário de 2.000 toneladas…”. O responsável da OMS assinalou: “A ajuda não pode estar condicionada nem ser utilizada como arma política”. Mas é óbvio que nem Trump nem Netanyahu vão renunciar a isso sob qualquer condição.

O Grande Israel é um projeto genocida

O plano do Grande Israel está a concretizar-se passo a passo. Enquanto o projeto de transformar Gaza num resort de luxo está em cima da mesa, no dia 22 de outubro o Knesset (Parlamento israelita) aprovava o debate de um projeto para anexar completamente a Cisjordânia. Mais uma vez, esta decisão foi criticada de forma hipócrita por alguns governos ocidentais, e até Trump fez declarações contra ela para inglês ver. Mas essas lágrimas de crocodilo não têm qualquer valor político sério. Estamos perante a mesma encenação cínica e desprezível que se repete desde os Acordos de Oslo de 1994.

As políticas de ocupação e colonização através de colonatos, declaradas ilegais pela ONU mas face às quais ninguém mexe um dedo, têm sido utilizadas durante anos para submeter a população palestiniana da Cisjordânia a um regime de apartheid, semelhante ao que a maioria negra sofreu durante décadas na África do Sul. E os governos capitalistas e a ONU limitam-se a fazer declarações, porque, tal como acontece com o financiamento da indústria militar sionista que devasta Gaza, essa política responde também aos interesses estratégicos do imperialismo estado-unidense e de centenas de empresas estado-unidenses e europeias que fazem negócios milionários com o Estado sionista.

Trump e Netanyahu jogam ao “polícia bom” e “polícia mau”, e alguns ingénuos acreditam, enquanto na prática, muito antes de 7 de outubro de 2023, impõem essa anexação de facto através da ação conjunta do exército regular e das bandas de colonos fascistas que atacaram dezenas de milhares de famílias palestinianas, causando milhares de vítimas, destruindo casas e roubando terras.

“Segundo a investigação da comissão da ONU, na Cisjordânia, território que Israel ocupa militarmente, as medidas implementadas pelo Governo israelita desde outubro de 2023 demonstram ‘uma clara intenção’ de transferir à força os palestinianos, ampliar a presença civil judaica israelita e anexar a totalidade da Cisjordânia. O relatório assegura que estas ações impedem a criação de um Estado palestiniano e estão orientadas para manter uma ocupação indefinida desses territórios”.

O Estado sionista só pode existir com base na ocupação e nas políticas de limpeza étnica e extermínio contra o povo palestiniano. A crise do capitalismo israelita empurra o regime nazi-sionista a continuar a semear o terror através do projeto do Grande Israel, cuja pedra angular é a dominação total da Cisjordânia e de Gaza, completada com o controlo de pelo menos o sul do Líbano e boa parte do sul da Síria.

Desde o anúncio da “paz”, além de continuar a transformar Gaza e a Cisjordânia num inferno, Israel lançou ataques contra o Líbano e o Iémen e novas ameaças contra o Irão e a Síria. Estas políticas militaristas e supremacistas contam com o apoio decidido do imperialismo estado-unidense.

Na sua tentativa desesperada de conter a ascensão do bloco imperialista rival formado pela China e pela Rússia, Trump utiliza o regime sionista de Netanyahu para fazer o trabalho sujo e enviar uma mensagem ao mundo: semearão a morte e o caos onde puderem antes de renunciar à supremacia.

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O Estado sionista só pode existir com base na ocupação e em políticas de limpeza étnica e extermínio contra o povo palestiniano.

A partilha do saque

Os planos para a partilha do saque já estão em marcha. Segundo o plano de reconstrução elaborado pela Casa Branca com o Governo de Telavive, o investimento inicial para reconstruir Gaza atingiria os 50 mil milhões de dólares.

Um relatório da ONU estima em 70 mil milhões. O ministro das Finanças israelita, o fascista Smotrich, explicava há um mês, numa reunião com especuladores imobiliários no Clube Financeiro de Telavive: “Israel começou conversações com os Estados Unidos para elaborar um plano de desenvolvimento para o enclave. Pagámos muito dinheiro por esta guerra, agora devemos decidir como repartir as percentagens da terra em Gaza”.

E Trump confirmou-o no seu discurso repugnante perante a Knesset, depois de felicitar o seu “melhor amigo” Bibi pelo papel vital “neste dia transcendental” e explicar que “Israel, com a nossa ajuda, ganhou tudo o que podia ganhar pela força das armas”: “Agora é o momento de traduzir essas vitórias contra os terroristas no campo de batalha no prémio definitivo: a paz e a prosperidade”.

Essa é a razão pela qual todos os grandes capitalistas, corporações e bancos apoiam a farsa do plano de paz orquestrado por Trump e Netanyahu: a partilha de um saque suculento e o medo de que o levantamento de massas contra o genocídio, que percorre o mundo, continue e se expanda, com consequências revolucionárias em diferentes países, a começar pelo Médio Oriente.

O capital de todo o mundo, e os governos ao seu serviço, fazem contas e tecem acordos procurando tirar o maior proveito possível dos planos para a reconstrução e exploração dos recursos de Gaza e da Cisjordânia. Isto inclui também os imperialistas chineses e russos, que não moveram um dedo para travar este massacre, colocando a estabilidade regional — necessária para proteger os seus acordos económicos e os projetos da Nova Rota da Seda — acima de qualquer outra consideração.

Só a luta internacionalista serve

O único caminho para conquistar a libertação e soberania da Palestina e pôr fim ao genocídio, como defendemos desde o primeiro momento na Esquerda Revolucionária, é continuar a impulsionar o levantamento global antissionista, antifascista e anticapitalista que, com epicentro em vários países europeus, se tem estendido por todo o mundo nos últimos meses.

Como dissemos no início desta declaração, os comunistas revolucionários defendem incondicionalmente o direito do povo palestiniano a defender-se com as armas na mão dos seus opressores. Também contra os clãs mafiosos formados por elementos degenerados e lumpenizados que traíram o seu próprio povo colaborando com o exército ocupante e saqueando a ajuda humanitária.

Mas a luta pela autodeterminação e libertação da Palestina tem de estar unida a políticas que impulsionem o levantamento revolucionário das massas contra o sionismo, o capitalismo e o imperialismo em todo o Médio Oriente, unindo a classe trabalhadora e todos os oprimidos sob a bandeira do socialismo.

O derrube do Estado sionista é impossível sem promover a luta de classes nos países vizinhos e pôr fim aos regimes árabes cúmplices e lacaios dos EUA. Não faz sentido proclamar como objetivo a destruição do sionismo e, ao mesmo tempo, manter uma posição de capitulação política perante os governos do Egito, Catar, Emirados Árabes Unidos, Arábia Saudita ou o Irão dos mulás.

É fundamental que a esquerda combativa palestiniana que luta e resiste ao ocupante, que sofreu brutalmente a repressão sionista e tem milhares de militantes presos, defenda uma política de independência de classe e consequentemente internacionalista.

Subordinar a política revolucionária, ou pior ainda, suspendê-la em nome de pactos com organizações fundamentalistas como o Hamas pode parecer prático e realista. Mas essa estratégia leva a transformar-se em peões do jogo diplomático dos regimes mencionados.

Os vínculos dos dirigentes do Hamas com o governo dos mulás, os xeques do Catar e a própria burguesia palestiniana e do resto do mundo árabe, bem como as suas ideias fundamentalistas, representam um obstáculo a uma luta anti-imperialista consequente e eficaz. O seu programa não é o da revolução: não pretendem derrubar o capitalismo no Médio Oriente nem desafiar os regimes árabes de que dependem política e financeiramente.

A libertação da Palestina só pode encontrar uma saída real através da revolução socialista, da luta por uma Palestina unificada e socialista no quadro de uma Federação Socialista do Médio Oriente. Só assim será possível criar as bases para uma convivência pacífica, onde os direitos democráticos de todos os povos e nações da região possam ser respeitados.

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